desisti oficialmente de procurar trabalho na capital de portugal. aborreci-me. fartei-me. já fui a sei lá quantas entrevistas para voltar recambiada sem saber se correu bem ou mal e um email de rejeição passado quase um mês - e maior parte das vezes porque eu, por cortesia, pergunto se há novidades. verdade que sei que me vou embora, mas não deixei de querer trabalhar ou procurar e agora sinto que oficialmente deixei. as pessoas também se cansam da rejeição e, apesar de ser insuportável ser sustentada, só posso depositar as minhas esperanças no meu próximo destino. não é fácil lidar com um mercado de trabalho que não dá oportunidade e ouvir dizer que temos demasiada experiência para a posição nem soa bem. o que é que é isso? querem alguém acabado de sair da faculdade que possam pagar o que quiserem? eu não me importo de receber aquilo que me quiserem pagar. desde que trabalhe e evolua e ocupe a cabeça. acho que é mais cansativo não fazer nada que fazer. ter de arranjar coisas que nos mantenham ocupadas e evitem que pensemos na morte da bezerra é mais complicado que nos serem dadas tarefas para cumprir e objectivos para atingir. apetece-me mandar um foda-se para esta merda toda porque é aquilo que me passa pela cabeça cada vez que tenho este tempo todo para pensar. a verdade que muita gente não sabe é que todo este processo faz uma pessoa duvidar das capacidades que tem. de todas. serei inteligente o suficiente? competente? pró-activo? bonito? faz uma pessoa sentir-se uma errata. e fodasse que me sinto uma errata. é verdade que não passo dificuldades. posso dar-me ao luxo de ir jantar fora de vez em quando, sair à noite ou comprar um gelado ao domingo (fatalista!). mas, todo este tempo faz-me pensar em quem não pode. quem tem de ficar em casa confinado aquele espaço, normalmente, familiar a bater com a cabeça na parede o dia todo, todos os dias. depois de pensar nessas pessoas penso naquelas que têm cancro ou uma outra doença com que combatem. e no manuel forjaz que morreu este passado fim de semana e tinha, ao que parecia, um espírito imbatível. depois penso que talvez deva ir ao médico fazer um check-up mas também não quero gastar dinheiro na consulta, no parque, na gasolina. depois penso em como é bom poder viver a vida e o quanto quero chegar, pelo menos, aos 95 anos. perder as funções motoras ou a capacidade de ouvir. penso no meu avô que já tem 86 anos e no que ele já deve ter vivido. depois nas saudades que tenho da minha avó que morreu há dois anos e dá-me um aperto no coração pensar que ela não esteve presente no meu casamento, uma fase que ia adorar. e nem acredito que me casei! sou incapaz de chamar ao manel marido e parto-me a rir cada vez que alguém o faz ou ele me apresenta como mulher. que sorte em ter o manel, uma das melhores e mais pacientes pessoas que já entrou na minha vida e nas vezes que eu não o mereço e, por causa de todo este processo, trato mal porque me sinto miserável com a situação em que estou e mesmo assim ele consegue animar-me e fazer-me festinhas e dar beijinhos e carinhos. não é normal a paciência que aquela pessoa tem comigo! e o que é que vou fazer para o jantar? podia continuar aqui o dia todo mas isto dá-vos um trecho daquilo por que passo todos os dias enquanto agradeço à vida pela sorte que tenho e a esmurro pela falta de oportunidades. só concluo que se queremos mesmo alguma coisa, temos de ser nós a ir procurá-la e/ou a fazê-la. e aquilo que eu quero, claramente, não está numa agência ou empresa, está em mim e nesta corrente de pensamento. se é que me faço entender.